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Salões III – a pintura




Salões III – a pintura
(Publicado na coluna Artes Visuais, Caderno Muito do Diário de Natal, em 11.12.08)

É possível falar sobre um retorno da pintura no momento atual da arte contemporânea.. Pelo menos como uma tendência. A densidade da presença das instalações e objetos (falarei disto, ainda) rarefaz-se diante de obras baseadas na fotografia e na vídeografia e, pouco a pouco, também face a esta nova leva de obras pictóricas. Em geral figurativas, diga-se de passagem. Este sintoma não é nitidamente detectável nos dois salões atualmente à mostra em nossa cidade.
No XII Salão de Artes Visuais da Cidade do Natal, em obras de dezesseis artistas que o compõem, algo como pintura só é perceptível em Ricardo Cerqueira e em Vicente Vitoriano. Na verdade, o trabalho de pintura em Cerqueira, a meu ver, é gravura com ferrugem, mais do que pintura propriamente dita. Já Vitoriano usa aquarela e cor de forma suplementar em obras categoricamente gráficas. E só.
No II Salão Abraham Palatnik, entre trabalhos selecionados e não aceitos (também expostos) há uma espécie de painel de obras pictóricas, não muito excepcional, é verdade, mas que desperta no conhecedor um interesse legítimo. Há autênticas ruindades como o que se vê em Walter Luz e Ana Marret, por exemplo. E Marret teve seus trabalhos selecionados! Inclusive, desbancando os de Patrícia Carli, com os que, de certa forma, apresentam algumas confluência no que diz respeito, particularmente, à opção pela abstração. Mas, enquanto a primeira é simplesmente tosca em seu expressionismo realizado, ou quase isto, com uma pintura primária e composições sofríveis, a segunda exercita-se em atraentes jogos construtivos muito próximos ao puro desenho. Embora figurativa, a obra apresentada por Newton Avelino faz eco, entre os selecionados, deste tipo de formulação gráfica colorida ao que se acresce uma personalíssima estilização das figuras e a abordagem de um tema que a aproxima de preocupações permanentes na arte do tipo engajada, aliás, muito presente na contemporaneidade. Mas é Júlio Siqueira que apresenta um bom exemplo deste filão “político”, com sua “MST”. Nesta pintura, não selecionada, o artista mostra-se razoavelmente bom em termos técnicos e chega a lembrar o realismo socialista ou, com bem maior distância, o próprio realismo “heróico” de um Courbet.
Ainda no Abraham Palatnik, temos dois bons trabalhos. Um deles, não selecionado, é o de Ivo Maia, uma pesquisa pictórica extremamente rica, baseada tecnicamente num grafismo simétrico e, conceitualmente, em algo que identifico com certas abordagens do simbolismo, quando pensamos em associações místicas ou em discursos ecológicos. O outro, selecionado, é o de Alberto Giuliani, um tríptico em refinada técnica de aquarela, que tem como tema uma prosaica embalagem de ovos. Esta obra, em que a imagem se completa na proximidade das três peças, teve bastante prejuízo quando exposta em (muito) separado, pelo menos, nos primeiros dias desde a abertura do Salão.
É possível atribuir esse problema de apresentação e equívocos de seleção/premiação ao procedimento de análise das obras por meio de fotografias. Tal procedimento exige, necessariamente, cuidados em duas vias: por uma, o primor pela qualidade das imagens fornecidas pelos artistas e, por outra, uma capacidade muita alta de percepção visual por parte dos analistas, quando têm que ponderar parâmetros como os de escala, cor, textura, entre outros.

Vicente Vitoriano

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