Pular para o conteúdo principal

Entre mares

Livia Flores mostra seu "cinema sem filme" e Sandra Cinto fala de ética e política, em duas exposições individuais no Rio de Janeiro

por Paula Alzugaray

MAR ES DO SUL Para Sandra Cinto, o oceano brasileiro não é festivo. É representado por cores sóbrias
Livia Flores – Sandra Cinto/ Galeria Progetti, RJ/ até 21/2
CINEMA SOBRE TELA Lívia Flores trabalha com padrões cinéticos

Depois de inaugurar a Galeria Progetti com uma exposição do artista grego Jannis Kounellis, a galerista italiana Paola Colacurcio se aventura pelos mares do sul, apresentando individuais de duas artistas brasileiras: a carioca Livia Flores e a paulista Sandra Cinto. As duas criaram trabalhos especialmente para a galeria, situada no centro histórico do Rio de Janeiro. Livia, que surgiu no contexto das artes visuais na mostra Como vai você, geração 80?, no Parque Lage, em 1984, fazendo pintura (como boa parte de sua geração), partiu depois a explorar projeções de filmes super-8, e hoje define seu trabalho como a prática de “fazer cinema sem filme”. Nessa exposição, a qualidade cinética de seu trabalho pode ser notada nas colagens com papéis de presente, esticadas em chassis e colocadas nas paredes – penduradas como se fossem pinturas ou como telas de LCD. O cinema aparece, especialmente, em uma escultura de espelhos, na forma de um rebatedor de luz, que poderia perfeitamente ser o instrumento de um fotógrafo. O objeto, que segundo a artista “rebate a imagem do ambiente”, foi instalado estrategicamente no vão livre da galeria, assumindo a função de “observatório”. De posicionamento articulável, a escultura pode, inclusive, refletir o trabalho de Sandra Cinto, instalado no andar térreo da galeria.


Sandra, que faz sua primeira individual em uma galeria carioca em 20 anos de carreira, começou e termina o ano de 2008 realizando instalações que têm o oceano como tema. A artista encerra aqui sua série Travessia difícil, inaugurada em janeiro com a instalação The difficult journey – after Géricault, na galeria Tanya Bonakdar, em Nova York. Lá, a artista representou um mar em fúria com milhares de barquinhos de papel que convergiam para uma série de reproduções da pintura A balsa da Medusa, de Théodore Géricault. Ela traz ao Rio uma variação sobre o mesmo tema. Utilizando os recursos da pintura, do desenho, da gravura e da fotografia em uma grande instalação, Sandra desenvolve a mesma narratividade realizada pelo pintor romântico naquela que é considerada a primeira pintura de teor abertamente político da história da arte francesa. Mas o que está em pauta aqui não é o drama específico das pessoas que tiveram que praticar canibalismo para sobreviver ao naufrágio da fragata Medusa, em 1816, por causa da ingerência de um capitão protegido por Luis XVIII. Através de Géricault, Sandra fala do drama de imigrantes nas fronteiras da Europa e dos Estados Unidos, dos abusos de poder e do naufrágio da ética na sociedade contemporânea. “Esse naufrágio, que aconteceu por questões políticas no século XIX, acontece hoje. Estamos vivendo essa crise!”, diz Sandra.


Diante da instalação, pensamos na população brasileira que vive à deriva e lembramos do caos e desamparo em que se encontra a população do Complexo da Maré, desde que, há duas semanas, o menino Matheus Rodrigues Carvalho, de 8 anos, foi morto à queima-roupa por um tiro de fuzil, quando saía de casa para comprar pão. O trabalho de Sandra tem um amplo significado político, que deve ser absorvido.


Disponível em : http://www.terra.com.br/istoe/edicoes/2042/artigo119682-1.htm


Karlene Braga

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

CULTURA E BELEZA...

Os padrões estéticos são diferentes para diversos povos e épocas. Muitas vezes o que consideramos algo bizarro e feio, para alguns povos é algo com significado especial e uma busca por outro padrão de beleza. Na África diversos povos possuem algumas práticas e costumes que podem parecer bizarros para os ocidentais. O povo Mursi, na Etiópia, costuma cortar o lábio inferior para introduzir um prato até que o lábio chegue a uma extensão máxima, costuma pôr também, no lóbulo da orelha. Ao passar dos anos, vão mudando o tamanho da placa para uma maior até que a deformação atinja um tamanho exagerado. Tais procedimentos estão associados a padrões de beleza.[...] As mulheres do povo Ndebele, em Lesedi, na África, usam pesadas argolas de metal no pescoço, pernas e braços, depois que casam. Dizem que é para não fugirem de seus maridos e nem olharem para o lado. Esse hábito também pertence as mulheres do povo Padaung, de Burma, no sudoeste da Ásia, conhecidas como “mulheres girafas”. Segundo a t

Iluminogravuras de Ariano Suassuna

1) Fundamentos da visualidade nas imagens de Ariano Suassuna: - É herdeiro de uma visão romântica: “invenção de uma arte tipicamente nacional”. - O nordeste surge como temática privilegiada no modernismo, especialmente, após a década de 1930; - Ariano acredita que a “civilização do couro” gestou nossa identidade nacional; - Interesse por iluminuras surgiu a partir de A Pedra do Reino 2)Iluminuras Junção de Iluminuras com gravuras. É um tipo de poesia visual: une o texto literário e a imagem. Objeto artístico, remoto e atual, que alia as técnicas da iluminura medieval aos modernos processos de gravação em papel. 3) Processo de produção de iluminuras Para confeccionar o trabalho, Ariano produz, primeiro, uma matriz da ilustração e do texto manuscrito, com nanquim preto sobre papel branco. Em seguida, faz cópias da matriz em uma máquina de gráfica offset; Depois, cada cópia é trabalhada manualmente: ele colore o desenho com tintas guache, óleo e aquarela, por meio do pincel. - Letras – ba

RCNEI - Resumo Artes Visuais

Introdução: As Artes Visuais expressam, comunicam e atribuem sentidos a sensações, sentimentos, pensamentos e realidade por vários meios, dentre eles; linhas formas, pontos, etc. As Artes Visuais estão presentes no dia-a-dia da criança, de formas bem simples como: rabiscar e desenhar no chão, na areia, em muros, sendo feitos com os materiais mais diversos, que podem ser encontrados por acaso. Artes Visuais são linguagens, por isso é uma forma muito importante de expressão e comunicação humanas, isto justifica sua presença na educação infantil. Presença das Artes Visuais na Educação Infantil: Idéias e práticas correntes. A presença das Artes Visuais na Educação Infantil, com o tempo, mostra o desencontro entre teoria e a prática. Em muitas propostas as Artes Visuais são vistas como passatempos sem significado, ou como uma prática meramente decorativa, que pode vir a ser utilizada como reforço de aprendizagem em vários conteúdos. Porém pesquisas desenvolvidas em diferentes campos das ciê