O JULGAMENTO DE PÁRIS . 1632-5 (RUBENS)
Óleo sobre madeira 144,8cm X 193,7 cm National Gallery, Londres
Fonte da imagem: www.rainhadapaz.g12.br/.../quatrofases/paris.htm
Na história da arte ocidental, os corpos femininos são um tema recorrente, construindo e consolidando através de pinturas e esculturas um olhar masculino sobre a imagem das mulheres em obras como, por exemplo, Olympia e Almoço na relva, de Manet, e Les demoiselles d'Avignon, de Picasso. Essas obras compõem, entre outras, um conjunto de imagens consideradas marcos nos seus respectivos períodos pela historiografia oficial. Imagens que, no entanto, se constituem representações de um determinado modo de ver muito particular. A chamada 'história universal da arte' é uma história particular, que sistematicamente vem privilegiando um determinado modo de ver como o único possível.
John Berger, por exemplo, argumenta o quanto a representação das mulheres na arte ocidental solidifica uma imagem feminina de passividade, de submissão a um olhar masculino, tanto do artista quanto do espectador preferencial -"os homens atuam e as mulheres aparecem". Para ele, o protagonista principal dessas obras, um suposto espectador masculino para o qual a obra é endereçada (tanto como espectador como possível comprador), nunca é pintado. A mulher é o motivo principal do nu como gênero da pintura a óleo européia, mesmo quando o tema a ser representado é uma alegoria ou história mítica. O tema do 'Julgamento de Páris' é um exemplo emblemático representado através de pinturas e esculturas por inúmeros artistas como Rubens (1577-1640), por exemplo.[...]O tema é o próprio nu feminino. E, no caso do Julgamento de Páris ou de As três Graças, um motivo para representar três nus femininos.
A sexualidade não é algo 'dado' pela natureza, que esteja simplesmente ancorado em um corpo que é vivido da mesma forma em todas épocas e lugares. A sexualidade envolve processos culturais e plurais, e como uma invenção social se constitui historicamente a partir de inúmeros discursos que a regulam e a normatizam, produzindo saberes e verdades'. Discursos que 'inventam' sexualidades femininas e masculinas circulam em torno das imagens produzidas por artistas, assim como sobre os próprios artistas - mulheres e homens.
A respeito da sexualidade feminina, Thomas Laqueur sublinha o que já vem sendo dito por estudiosas feministas: é a sexualidade da mulher que está sempre em constituição, ela é a categoria vazia. Apenas a mulher parece ter 'gênero', uma categoria definida a partir de uma diferenciação sexual cuja norma sempre tem sido masculina. Nas artes visuais, em especial na história da arte ocidental (principalmente a partir do Renascimento), proliferam representações do corpo nu feminino, que manifestam através de olhares para um fictício espectador a submissão ao próprio artista e ao proprietário da obra.
Embora o corpo feminino na arte ocidental estivesse em evidência, isso necessariamente não queria dizer que a própria mulher (como um sujeito com vontade própria) e a sua sexualidade também o estivessem. Na verdade, nas representações dos nus femininos, é a sexualidade masculina que está em jogo, tendo muito pouco a ver com a própria sexualidade feminina.
Alguns trechos do artigo de Luciana Gruppelli Loponte, intitulado "Sexualidades, artes visuais e poder: pedagogias visuais do feminino", publicado em
Revista Estudos Feministas
ISSN 0104-026X versão impressa
Rev. Estud. Fem. v.10 n.2 Florianópolis jul./dic. 2002
doi: 10.1590/S0104-026X2002000200002
Disponível na íntegra em
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-026X2002000200002&lng=pt&nrm=iso
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