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Que ensino é esse?

Jorge Portugal

De Salvador (BA)


(foto: Francisco Stuckert/ Futura Press)

Costumava, em todo início de ano, logo na primeira semana de aula,

fazer um investigação sumária sobre o nível de informação dos meus alunos de redação.

Nada que exigisse metodologia complicada, tabelas e complexidades estatísticas, nada disso.

A avaliação consistia na apresentação de alguns itens expressos por nomes,

fórmulas, frases, siglas, representativos do patrimônio cultural da humanidade

em épocas distintas e que, em tese, qualquer ser humano,

pretendente a uma carreira no nível superior de ensino, deveria conhecer.

Algumas referências da lista: OMC, BIOÉTICA, "PENSO; LOGO EXISTO",

OS NOMES DE TRÊS MINISTROS DO GOVERNO DE ENTÃO

e SUAS RESPECTIVAS PASTAS etc.

Pois bem. Era de se esperar que a garotada cevada de informações

nos melhores colégios de Salvador, a preços que ficam na média de R$1.500, tirasse

de letra um elenco de atualidades tão óbvias.

Qual nada! Havia turmas em que 55% dos estudantes

não sabiam dizer uma palavra sequer sobre qualquer um dos itens apresentados!

Na maioria dos que o faziam, a resposta era sempre superficial,

limitando-se, no caso das siglas, a "traduzir" o que elas significam.

Relacionar algum dos itens com a sua realidade?

Dizer o quanto, por exemplo, uma decisão da OMC

podia afetar o seu dia-a-dia de jovem da periferia capitalista?

Nem pensar! Em compensação, esses garotos e garotas tinham,

na ponta da língua, o caminho para resolver todas as complicações

dos NÚMEROS COMPLEXOS, discorriam soberanamente

sobre as TRÍADES DE DÖBENREINER,

e conheciam profundamente o CICLO DE VIDA DAS ANGIOSPERMAS.

Informações que, a depender da carreira escolhida,

ele jogaria na lata do lixo no primeiro dia de universidade.

Caso se perguntasse qual a conseqüência da queda

dos juros no padrão de vida de sua família - coisa que afeta seu cotidiano imediato -

eles não saberiam responder.

Não admira que esses estudantes, transformados em candidatos ao Enem,

exibissem um número médio de acertos que mal chega a 50% da prova.

Por quê? Pelo simples fato de que esse exame vale-se de uma prova

que investiga competências e habilidades e não apenas capacidade de memorizar dados.

Uma prova que pede um olhar sintonizado com a contemporaneidade dos fatos científicos

e a relação destes com a nossa vida. E a escola que nós temos, infelizmente,

não prepara nossos jovens para, inteligentemente, "ligarem as coisas".

Pergunta para reflexão: que sistema de ensino é esse que premia a "decoreba",

cria um programa de cultura inútil que massacra a cabeça da garotada

e não deixa espaço na mente do aluno para a inteligência e a reflexão?

O debate sobre o futuro do País passa por aí.

Jorge Portugal é educador, poeta e apresentador de TV. Idealizou e apresenta o programa "Tô Sabendo", da TV Brasil.

http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI5398116-EI17956,00-Que+ensino+e+esse.html

(Erinaldo Alves)

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